quinta-feira, 4 de junho de 2009

Uma das maravilhas de Chico Buarque


Construção

Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego

Amou daquela vez como se fosse o último
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Subiu a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Sentou pra descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público

Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contra-mão atrapalhando o sábado

Por esse pão pra comer, por esse chão prá dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir,
Deus lhe pague
Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça e a desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair,
Deus lhe pague Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir
E pelas moscas bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir,
Deus lhe pague


Chico Buarque

---

4 comentários:

  1. Oi Amiga,

    O Chico é Tudo de bom. E a construção é o mássimo.
    Beijos,
    Dalinha

    ResponderExcluir
  2. Dalinha,
    valeu pela visita e verso!
    Um lindo fim de semana para você e os seus.
    Beijos.

    ResponderExcluir
  3. "Conte a sua história ao vento,
    Cante aos mares para os muitos marujos;
    cujos olhos são faróis sujos e sem brilho.
    Escreva no asfalto com sangue,
    Grite bem alto a sua história antes que ela seja varrida na manhã seguinte pelos garis.
    Abra seu peito em direção dos canhões,
    Suba nos tanques de Pequim,
    Derrube os muros de Berlim,
    Destrua as catedrais de Paris.
    Defenda a sua palavra,
    A vida não vale nada se você não
    viver uma boa história pra contar."
    (Pedro Bial)

    Na impossibilidade de entrar em detalhes, como eu gostaria imensamente como todos amigos que tenho, venho trazer um pouco de poesia e desejar que seu domingo, sua nova semana seja de mil cores, que tenhas muitas alegrias!

    Um abraço

    Sônia

    ResponderExcluir
  4. Sonia,
    como sempre nos deixa lindos versos.
    Obrigada pela visita, r tenha um feliz semana.
    abraços.

    ResponderExcluir

 

blogger templates | Make Money Online

Clicky Web Analytics